quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Para que Serve a Filosofia: O mal estar Na Sala de Aula e o Que Podemos Esperar da Filosofia – Parte I [1]

Algumas vezes, ao iniciar uma aula de introdução à filosofia, não é incomum eu ouvir de um ou outro dos meus alunos mais corajosos a pergunta “mas afinal de contas, para que serve a filosofia?”  É claro que qualquer professor experimentado diria que, em muitos casos, essa pergunta traduz a conhecida inclinação juvenil em esquivar-se de esforços intelectuais que não sejam estritamente necessários, mas nem sempre isso é verdade. Algumas vezes, penso, pode-se perceber nesses mesmos alunos uma genuína insatisfação em relação às aulas de filosofia; o que é legítimo, uma vez que as intuições e pressupostos que deram origem a essa disciplina estão tão afastados das linhas mestras que definem o espírito de nossa cultura. Conheço professores e autores que traduziriam esse afastamento como um sintoma da “decadência moral”, insensibilidade e preguiça intelectual, fenômenos que caracterizariam a alienação das sociedades de massa. Alguns desses professores talvez pensem que para valorizar a própria disciplina é necessário desvalorizar “teoricamente” os traços que caracterizam as sociedades que desprezam essa mesma disciplina.  Essa desvalorização, contudo, estabelece um impasse. Ela cria um abismo entre as expectativas dos alunos acerca de qualquer conhecimento relevante e as próprias convicções do professor acerca do que merece ser chamado de filosofia. Suponho que esse abismo se torna mais fundo em função da persistente atitude crítica desses professores diante das intuições “pragmáticas” e “contextualistas” da cultura contemporânea. Essa atitude, penso, apela para uma suposta faculdade, ou habilidade, que tornaria os alunos capazes – se tiverem boa vontade - de considerar certas “problemáticas” cuja relevância seriam evidentes em si mesmas. Ao tentar desqualificar o desdém dos alunos por sua disciplina, esses professores utilizam-se frequentemente de narrativas históricas que colocam esse mesmo desdém como o resultado de um lento processo de decomposição da capacidade de dar-se conta de problemas perenes, cuja importância deriva de nossa condição  distintivamente humana. Essa dramatização é o único recurso que eles têm para tentar reestabelecer o fio do diálogo e, desse modo, obter dos alunos a disposição em considerar suas preciosas questões filosóficas.  Entretanto, acho difícil conseguir a simpatia de nossos interlocutores através de narrativas que desqualificam massivamente os traços que definem suas identidades. Por outro lado, a compreensão da filosofia como uma disciplina capaz de avaliar as pretensões de outras áreas da cultura de uma perspectiva privilegiada induz a esse tipo de desqualificação.  Se correta minha análise do impasse descrito acima, este deve-se a  um choque entre dois padrões distintos de auto-compreensão que entram em conflito, um dos dois precisa ser modificado, ainda que sutilmente, ou o diálogo persistirá sendo inviável.
O impasse que descrevi acima é um exemplo concreto de uma problemática mais ampla e com muitas outras consequências. Assim como outras situações, ele traz para o centro do debate filosófico a questão das possibilidades e limites de uma filosofia pós-metafísica e alinhada com as tendências e expectativas da sociedade contemporânea.  Ou seja, uma vez que a popularização das ciências e o relativo prestigio que a arte adquiriu nas “endinheiradas sociedades do ocidente” estabeleceu uma espécie de “materialismo de senso comum” como padrão cultural dessas sociedades, qual deveria ser o perfil da filosofia contemporânea? A pergunta tem um caráter eminentemente prático, pois apela para a intuição de que o entrelaçamento entre filosofia e o jogo de dar e receber razões exigiria dessa disciplina, em alguma medida, uma certa atenção e envolvimento com as questões e dilemas que são relevantes para os participantes desse mesmo jogo, sob risco de se tornar monológica, sacerdotal e inócua do ponto de vista político cultural.
  A questão, entretanto, não precisa ser colocada apenas desse modo. Poderíamos também considera-la de um ponto de vista mais teórico. Ou seja,  uma vez que os desdobramentos da filosofia pós-analítica, do pós-estruturalismo e das críticas à proposta de um “materialismo científico”  lançam sérias duvidas sobre os projetos fundacionistas da filosofia clássica, existiria ainda algo a ser feito pela filosofia em relação à questões de ordem ética ou política, algo mais do que estimular uma atitude de suspeita?  Ou a filosofia deveria tornar-se “científica” e debruçar-se apenas sobre os aspectos formais do discurso e dos juízos? Esses dois modos de abordar a questão da possibilidade, ou da desejabilidade, de uma filosofia pós-metafísica e pós-epistemológica, indicam por sua vez dois modos distintos de compreender a função da filosofia. A primeira formulação do problema leva a sério a necessidade de impedir que a filosofia se torne inócua do ponto de vista prático. A segunda elaboração do problema, por sua vez, leva a sério apenas questões de ordem teórica, pois entende que apenas essas questões são relevantes para o pensamento filosófico. Formular o problema da primeira maneira me parece a melhor saída. Essa saída consiste em pensar a filosofia de um modo que  toma o aparente problema como algo que precisa ser encarado sem procurar escapar das pressões históricas e culturais que suscitam a pergunta.
O filósofo hoje, penso, precisa ser muito mais erudito e sensível às demandas do seu tempo do que jamais foi. Ele precisa ser um poli-instrumentista em termos de vocabulários, referências e sensibilidade existencial e/ou política. Em tempos de internet a especialização do trabalho do filósofo é algo que precisa dividir espaço, e talvez o maior espaço, com uma auto-formação abrangente e sofisticadas o bastante para permitir que ele possa intervir de modo eficiente na sociedade da qual ele participa. Alguém que domina muitas referências, e que através da exegese filosófica dotou-se da habilidade de explicar livros importantes para a tradição ocidental, é capaz – penso – de dar uma contribuição importante para a ampliação das possibilidades prático-existenciais de nossos jovens.  Outros intelectuais também podem fazer isso, claro, recorrendo a cânones e abordagens diferentes, mas nesse caso o sucesso depende do abandono da velha por um “método”. Como toda obsessão essa também nos impede de dar resposta aos problemas práticos de nossa época.



[1] As ideias apresentadas nesse ensaio  procuram nortear-se pelo trabalho do Filósofo Norte-Americano Richard Rorty. 

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Novamente o amor...

Elize Araújo Kitano Matsunaga, acusada de matar e esquartejar seu marido, Marcos Kitano Matsunaga, pode ter pena atenuada por ter matado o marido por motivos "passionais". Ou seja, em pleno século XXI a sociedade ainda fornece facilidades a assassinos com o argumento de que a pessoa "apaixonada" pode ficar "cega", perdendo, portanto, parte de sua capacidade de fazer escolhas. Talvez seja verdade que após ceder aos impulsos possessivos o indivíduo entre em um redemoinho de pensamentos que o arrasta e o leva, as vezes, ao crime. Mas o que também é verdade é que antes de ceder a esses impulsos ele, ou ela, teve escolhas. Podia não ter cedido a "tentação" de pensar que o outro, ou a outra, era sua propriedade e que a infidelidade lhe dava "direitos" sobre o corpo do "transgressor". Assassinato passional, penso eu, é inominavelmente mais bárbaro que o latrocínio puro e simples e enquanto o mito da "cegueira" das paixões persistir em nossa cultura continuaremos matando, esquartejando e mutilando...por amor.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Duas versões sobre um mesmo tema: O pensamento de John Rawls segundo Chantal Mouffe e Richard Rorty

O presente artigo propõe-se favorecer um confronto entre duas interpretações do pensamento do filósofo político John Rawls: a arguta crítica elaborada pela filósofa pós marxista Chantal Mouffe e a abordagem do filósofo norte americano Richard Rorty. Inovadora e instigante, a obra magna de John Rawls Uma Teoria da Justiça representa um marco para filosofia política contemporânea. Segundo o estudioso de sua obra Nythamar de Oliveira Rawls pretendia com sua obra “elevar a um nível mais alto de abstração teórica a concepção de justiça inerente ao contratualismo de Rosseau, Locke e Kant“ terminando por oferecer um “modelo procedimental capaz de conciliar igualitarismo e individualismo” (2003, pg.11). O modo inovador de lidar com essa última pretensão é que tornou as formulações de John Rawls referência nos debates sobre filosofia política. Seja como objeto de crítica como vemos no trabalho da filósofa pós-marxista Chantal Mouffe, ou de reinterpretação como vemos no trabalho do pragmatista norte-americano Richard Rorty o trabalho de John Rawls representa um marco na filosofia política do século XX.

Em seu interessante livro denominado O Regresso do Político Mouffe oferece uma arguta análise dos principais argumentos de Rawls a favor de uma versão não-utilitarista do liberalismo, versão essa cuja principal característica para a autora seria o fato de ela oferecer uma concepção liberal de justiça baseada em direitos. No entanto, em sua análise da obra do americano a pensadora pós marxista critica os meios adotados por Rawls para defender tal concepção ao mesmo tempo em que procura defender uma concepção similar de um modo alternativo, um modo que pretende esquivar-se aos supostos “vícios individualistas” presentes na obra deste; um modo que ela considera mais fiel ao que denomina de “nossa tradição política”. A crítica que Mouffe direciona a Rawls, portanto, estaria voltada principalmente para os procedimentos argumentativos adotados por este para defesa da sua concepção de justiça baseada em direitos, uma concepção que ela acredita que deveria ser defendida por outros meios. A segunda interpretação do pensamento de Rawls que pretendo contrapor as teses de Mouffe é a do filósofo americano Richard Rorty. No texto Justiça como Lealdade Ampliada Rorty analisa o texto de Rawls sob uma perspectiva que procura dar menor relevância aos aspectos kantianos e racionalistas do vocabulário presente na filosofia desse último, ao mesmo tempo em que propõe uma determinada interpretação do “consenso por sobreposição” sugerido por Rawls, uma interpretação em termos naturalistas, retóricos e não-essencialistas. O consenso por sobreposição (Overlaping Consensus) é um termo central para a filosofia de Rawls. Na filosofia do pensador americano ele é nada menos que o modelo que orientaria nossas tentativas de formular os princípios básicos de justiça em uma sociedade democrática. Ao contrário de Mouffe, para Rorty, o aspecto de maior relevância no pensamento de Rawls seria o anti-essencialismo de sua concepção de justiça, um aspecto que nos permitiria efetuar a superação de determinados aspectos normativos que têm sido considerados cruciais para a filosofia clássica. Com essa oposição entre as duas interpretações de determinados aspectos da teoria política de J. Rawls pretendo apontar o que são, para mim, os defeitos e virtudes da idéia de uma política agonística nos termos em que tal idéia é defendida por Chantal Mouffe.

Foi Hegel, segundo Rorty, o primeiro filósofo a considerar a história como um fator relevante, senão o mais relevante, para o pensamento filosófico. É um fato conhecido que a tendência historicista do pensamento hegeliano foi herdada, bem ou mal, por Karl Marx. Contudo, nos dias atuais, nem todos os marxistas parecem dispostos a assumir o mesmo apreço que Marx e Hegel afirmavam ter pela história, talvez por temerem que as conseqüências de tal apreço venham a exigir um amplo trabalho de revisão, o qual poderia levar ao abandono de algumas teses centrais, porém possivelmente obsoletas . Esse não é o caso da filósofa Chantal Mouffe. Consciente dos problemas e perigos que a contemporaneidade apresenta, das mudanças ocorridas no seio das sociedades pós-industriais e da necessidade de “empunhar novamente as armas da crítica” a autora não teme oferecer uma versão pós-moderna e pluralista da crítica Marxista. Essa versão cuja principal característica, na minha opinião, consiste em afirmar o que seria “a natureza intrínseca do político” como um espaço de disputa e abertura, e portanto de crítica, procura preservar a possibilidade do exercício combativo e militante, valorizando o pluralismo e a ênfase nos direitos também característica do liberalismo de John Rawls.

A análise mouffiana do pensamento político de Rawls situa esse último como um representante do novo paradigma liberal, um paradigma que encontra-se sob ataque dos representantes do pensamento comunitarista. Inspirados por Aristóteles e Hegel os comunitaristas afirmam que o principal problema para as sociedades democráticas não é a dificuldade de encontrar uma equalização satisfatória de interesses divergentes, como pensam liberais como Rawls, e sim o “desaparecimento da virtude cívica, e da identificação de uma comunidade política” (Mouffe, 1996, pg. 40) Para a filósofa a mais contundente objeção do comunitarismo ao liberalismo consiste na crítica da “concepção anti-histórica, associal e desintegrada de sujeito implícita na idéia de um indivíduo dotado de direitos naturais prévios a sociedade e na rejeição da prioridade do bem sobre o direito” (Op. cit. pg. 44). Seria o “atomismo” presente no pensamento de Rawls que o conduz a uma concepção de justiça “empobrecida”, transformada em mero acordo de interesses, e que não dá conta da experiência vivida no seio de uma comunidade. É dessa experiência, afirmariam os comunitaristas, que se constituiria nossa própria identidade moral, que brotariam noções como bem e mal, justiça e injustiça, não havendo portanto nenhuma prioridade do direito sobre o bem. Mouffe assume as críticas dos comunitaristas ao liberalismo individualista de Rawls, mas recusa-se a abrir mão de uma concepção de justiça baseada em direitos. Mouffe tem em vista os “perigos” de uma concepção de política baseada na idéia de um “bem comum substantivo” como sugerem os comunitaristas. Parece óbvio que ela tem em mente as perigosas aventuras do nacionalismo, do facismo, do stalinismo e do nacional-socialismo. Contudo, Mouffe também admite junto com os comunitaristas, a necessidade de resgatar algo como uma “cultura cívica”, que permita que o estímulo à participação política possa contar com algo mais que o aleatório e pouco confiável cálculo interesseiro. Portanto, a reflexão da filósofa orienta-se segundo os seguintes expedientes: preservar a idéia de uma concepção de justiça baseada em direitos, e portanto pluralista, e conciliar essa concepção de justiça com uma determinada concepção da esfera pública, ou como ela mesma denomina, do político. Não é preciso muito esforço para perceber que Mouffe reassume uma das tarefas às quais o jovem Hegel se havia proposto, uma tarefa que Hegel procurava cumprir através de uma versão “estetizada” da ética, e portanto da política, uma versão que pudesse servir de contrapartida unificadora das agudas divisões da sociedade civil sem eliminá-las por completo. É claro que para Mouffe, ao contrário de Hegel, o vínculo político não deveria possuir um caráter “ético-moral” como percebemos nos desdobramentos da filosofia hegeliana, contudo, este também não poderia ser visto de modo “meramente instrumental”, como sugerem os liberais. Mouffe parece defender algo como um “termo médio” entre o cálculo de interesses liberal e o bem comum comunitarista como fundamento para sua definição do caráter próprio do político. Sua crítica de Rawls, portanto, é uma crítica que aponta a ausência do que ela considera “propriamente político”. Mas qual é exatamente a natureza dessa expressão? Em outros termos, Chantal Mouffe assume uma posição essencialista acerca do que é e do que não é o político? Nesse caso, não estaria ela em contradição com sua própria rejeição do universalismo? Não parece ser esse o caso. Ela afirma simpatizar com a afirmação de Rawls de que “deveríamos partir de nossa tradição democrática para elaborarmos uma concepção de justiça” (Op. cit. pg. 69) Mas, nesse caso, ela assume então uma postura perspectivista e relativista? Se for assim, o argumento favorável a delimitação de uma esfera propriamente política no interior da nossa tradição se basearia não em uma “visão acurada”, mas em uma “aposta” sobre o que a história nos tornou? Sendo assim, ela poderia esquivar-se ao próprio instrumentalismo que ela também rejeita como uma posição tipicamente liberal? Qual o estatuto epistemológico do seu discurso? Vejamos.

Para Mouffe a história recente do ocidente liberal acarretou a separação entre duas esferas que até então se interpenetravam: a esfera pública e a esfera privada. Conseqüentemente tal separação implicou a recusa de “uma concepção exclusiva do bem moral” uma vez que a sociedade a partir de então teria que procurar o caminho para convivência pacífica entre diferentes indivíduos com diferentes concepções morais. Contudo, segundo a autora, a rejeição de um bem comum substantivo como constitutivo da idéia de organização política não deveria implicar o abandono da tentativa de definição de um tipo de bem especificamente político, “um bem que define a associação política enquanto tal”. Afirma ela:

“Se um regime político tem que ser agnóstico em termos de moral, não é – nem pode ser – agnóstico no que diz respeito ao bem político, uma vez que afirma os princípios políticos de liberdade e igualdade.”(Op. cit. pg.49)

Qual o estatuto epistemológico do “nem pode ser” sustentado por Mouffe? Trata-se de uma observação de caráter pragmático, indicando os indesejáveis resultados práticos de um agnosticismo moral estendido ao campo político? Ou um juízo essencialista acerca do que “realmente é” o político que a história nos legou? O texto de Mouffe não me parece permitir uma resposta clara a essa pergunta. Em algumas passagens ela parece oferecer a sua concepção do político como um fundamento epistemológico alternativo para uma concepção de justiça baseada em direitos. Uma alternativa à idéia “atomística de indivíduo” supostamente utilizada pelo discurso liberal de John Rawls como fundamento para sua prioridade do direito em relação ao bem comum. Uma concepção do bem político (que nesse caso seria caracterizado pela abertura, pelo conflito etc.), que não seja simplesmente instrumental tornaria obsoleto o discurso individualista para defesa da prioridade do direito sobre o bem. Mas, enquanto Rawls em seus últimos trabalhos se aproximou de uma posição contextualista, visando esquivar-se dos problemas advindos da assunção de um universalismo ético sem deixar de manter-se coerente como seu individualismo pluralista, Chantall procura afirmar a sua definição do político como um tipo específico de bem, um tipo diverso do bem moral, mas cuja natureza ambígua dificulta a correta compreensão.

Se estou correto em minha interpretação, o bem político é um bem relativo às ações humanas, ao que devemos e não devemos fazer em relação ao espaço público. Contudo, uma vez que Mouffe não reconhece o bem político como um bem moral, parece, a primeira vista, que ela propõe a superação da conhecida distinção, que ela denomina de positivista, entre juízos de fato e juízos de valor. Ela pretende ter encontrado um terceiro termo “cuja natureza independe da moral (valor) e da economia (fato)” (Op.cit. pg.70) Segundo a autora o erro de Rawls e outros liberais consiste justamente em pensar o político em termos morais “negligenciando portanto o papel desempenhado pelo conflito, pelo poder e pelo interesse.” (Op. cit. pg. 71) Mas não estão estas palavras “carregadas” de um sentido moral? Aliás, uma das propostas da filosofia de Richard Rorty, que ela critica severamente, consiste em oferecer uma filosofia moral na qual estas expressões tornam-se centrais para a elaboração de qualquer vocabulário moral. Além disso, filósofos como Hobbes, Max Stirner e Nietzsche já haviam indicado caminhos para a reflexão moral que tomam essas expressões como pontos de partida. Contudo, para Mouffe, a consideração do conflito por si mesmo (e não pelo prazer como é o caso de Stirner) como fator fundante do político exclui definitivamente a possibilidade de uma estabilização, definitiva ou não, dos valores públicos. “Na política o interesse público é sempre matéria de discussão e nunca pode ser alcançado um acordo final.” (Op. cit. pg. 72) A aguda divisão apontada pela filósofa parece indicar a inexistência de pontos de convergência, ou de sobreposição, pontos sobre os quais os disputantes poderiam apoiar-se para dissolução do próprio conflito. Contudo, uma compreensão naturalizada da sociedade que vincule a moralidade às condições sócio-históricas de desenvolvimento coletivo não poderia deixar de considerar a possível ocorrência desses pontos. A fixação dos consensos poderia ser momentânea ou perene e a ocorrência de um caso ou de outro estariam submetidos à contingência. Nesse caso os conflitos estariam presentes de modo inversamente proporcional à proximidade cultural, e poderiam ser desfeitos através de recorrentes tentativas de aproximação. Contudo, a defesa mouffiana do agonísmo político não vai por esse caminho.

O modo como Mouffe enfatiza o caráter necessariamente aberto do político parece excluir qualquer possibilidade de uma compreensão naturalizada do vínculo social, e portanto, aproximar-se do que poderia ser chamado de uma abordagem idealista da tradição política. Minha própria sugestão é de que ela movimenta-se entre o historicismo e o essencialismo, de um modo que sacrifica o primeiro em função do segundo, e sua compreensão do político representaria nessa minha leitura uma concepção do que o devir histórico nos tornou “de fato”, pessoas cuja moralidade (embora ela não queira aplicar essa definição ao âmbito político) possui duas facetas: uma pública e uma privada. Isso deixaria a argumentação mouffiana exposta às mesmas críticas que filósofos anti-essencialistas direcionam ao marxismo clássico. Além do mais, não consigo ver como o que Chantal Mouffe propõe como “a natureza intrínseca do político” pode não ser mais que uma tentativa de propor uma moral reguladora como determinante do espaço público. Em última instância, seu argumento me parece reinvidicar para si a posse de uma “representação acurada de uma determinada faceta do real”, nesse caso representado pelo que ela chama de “o político”. De outra maneira, em que se basearia a pretensão de legitimidade de seu discurso, se ela abertamente rejeita o instrumentalismo de tipo pragmático bem como o individualismo racionalista como recursos viáveis para a criação/legitimação de um vínculo moral? Não vejo como escapar desse impasse que acredito constituir um dos principais problemas de O Retorno do Político. Embora tenha muita simpatia pela defesa do agonismo sustentado por Mouffe penso que ela o defende de modo equivocado. O agonismo, como indiquei acima, poderia ser uma decorrência de uma abordagem naturalizada do pensamento político. Se o conflito deve ser acolhido no seio da tradição política os argumentos para defendê-lo deveriam, penso, ser de ordem pragmática, visando o empoderamento dos indivíduos particulares contra os possíveis riscos da homogeneidade social. Uma abordagem pragmática procuraria oferecer formulações políticas que ecoassem filosoficamente o darwinismo e o freudismo que tornaram pouco plausíveis as abordagens idealistas e racionalistas do vínculo moral. O filósofo Richard Rorty é para mim um exemplo deste tipo de abordagem.

Em justiça como Lealdade Ampliada, Richard Rorty utiliza-se do mesmo objeto de análise de Chantal Mouffe para daí derivar conclusões bem diferentes. É interessante notar que além de Rawls, Rorty também cita um outro autor recorrente no discurso de Chantal Mouffe, Michael Walzer. Apesar dessas “coincidências” Rorty é duramente criticado por Mouffe por confundir em uma “amálgama ilegítima” liberalismo econômico e liberalismo político. Contudo, o que Mouffe não diz nem pode dizer, é que essa “amálgama ilegitima” é uma decorrência do procedimento narrativo rortyano, de sua postura assumidamente “darwinista”, uma estratégia que visa manter a coerência entre suas teses políticas e seus pressupostos nominalistas e retóricos, aos quais irei me referir apenas de modo sucinto. Mouffe considera “meramente contingente” a fusão entre liberalismo econômico e liberalismo político. Rorty parece adotar o mesmo ponto de vista. Contudo, por acreditar que nada escapa a essa mesma contingência Rorty acredita-se autorizado empenhar-se em um dado tipo de contingência que lhe parece mais proveitoso oferecendo em seguida uma narrativa que possa parecer coerente aos seus interlocutores. Essa é uma das características do que ele chama de redescrição.

Na análise do pensamento de Rawls Rorty irá utilizar-se de um procedimento semelhante. Adotando a mesma linha de investigação de outros liberais a reflexão política do filósofo americano parte do pressuposto de que a política é uma esfera da moralidade. Contudo, ao contrário de outros filósofos, ele pretende manter separadas a moralidade pública e a moralidade privada. É por isso que para Rorty a proposta de uma compreensão do vínculo social que não apela para a oposição de natureza entre justiça (moralidade pública) e lealdade (moralidade privada) é o principal mérito da filosofia de Rawls. Ao invés de sugerir, como Kant, que a nossa concepção de justiça já nasça “universalizada” e emancipada dos seus laços de lealdade Rawls sugeriria um processo de ampliação/universalização das lealdades. Rorty acredita que Rawls assim como Walzer sugerem que a nossa noção de justiça seja vista como de modo não dicotômico em relação aos vínculos de compromisso estabelecidos com grupos menos extensos. A distinção utilizada por Walzer para substituir a dicotomia justiça/lealdade é a variação entre graus densos e ralos de lealdade. A lealdade densa referiria-se aos grupos menores, grupos como família, tribo, amigos etc, enquanto lealdade rala diria respeito a grupos mais extensos como as nações ou a humanidade. Rorty acredita que poderíamos encontrar no pensamento de Rawls uma réplica dessa mesma estratégia, que no caso de deste é apresentada nos termos de “um conceito compartilhado de justiça e várias concepções de justiça conflitantes entre si.” (RORTY, 2009, pg.88). Uma vez estabelecida nestes termos a solução de impasses de natureza ética não se basearia apenas no “cálculo de interesses”, como Mouffe afirma que é o que Rawls sugere. O procedimento para obtenção do consenso seria ‘construtivo” em termos de moral. Tratar-se-ia do empenho em estender à outras pessoas os laços de lealdade que naturalmente nos vinculam a grupos menores. Apenas no caso de insucesso nessa meta o recurso explícito a interesses seria utilizado, o que configuraria o que Rawls chama de modus vivendi hobesiano.

Penso que esse modo de interpretar o pensamento de John Rawls permite minimizar a relevância do “atomismo social” tão criticado por Mouffe. A concepção de individualidade imanente a tal construtivismo moral sugere que “nossa identidade moral é determinada pelo grupo ou grupos com os qual nos identificamos – o tipo de grupo como qual não podemos ser desleais e ainda assim ser nós mesmos.” (Op. cit. Pg. 86) A afirmação Mouffiana de que “A teoria de Rawls toma como certa a existência de um interesse próprio racional comum sobre o qual os cidadãos, agindo como pessoas morais livres e iguais podem concordar (...)” não casa bem com a idéia do construtivismo moral. Pois, se essa idéia fosse dada por uma suposta faculdade racional ela não precisaria ser “construida” de modo procedimental. Ou seja, para seus propósitos de crítica ao liberalismo penso que Mouffe acentua em demasia os traços atomísticos-individualistas do pensamento de Rawls, encontrando um sujeito monádico que Rorty prefere ver como uma trama de lealdades.

As implicações dessas concepções são perceptíveis na filosofia de Rawls. O abandono da contradição entre interesse pessoal e moralidade seria uma dessas implicações. O procedimento para a criação de um vínculo social abrangente não mais seria o da imposição de uma única concepção moral que impusesse o abandono de todas as lealdades contraídas no seio da vida social. Ao contrário, tal vínculo seria “construído” através do Consenso por Sobreposição. Contudo, Rorty também aponta as contradições entre essa moral “construtivista” e os traços universalistas que ela herda do kantismo, e por isso sugere à Rawls a definitiva adoção de um “contextualismo forte” que livraria suas teses das contradições apontadas por alguns críticos. Ele sustenta uma postura em relação ao vínculo político que defende, assim como Mouffe, o pluralismo, o debate e a abertura. Rorty usa a tese acerca do construtivismo moral de Rawls procurando separá-la do essencialismo de outras formulações do mesmo autor, visando assim conciliar a defesa da diferença e da disputa com a desejável criação e ampliação de consensos.

Se o conflito é acolhido por Rorty este acolhimento é feito em função da potencialização da capacidade de transformação da sociedade. Esse seria o seu romantismo: a defesa da auto-criação e da ironia como valores muito desejáveis para os indivíduos de uma sociedade liberal-democrática. A abordagem Rortyana aborda as questões de natureza especificamente política através sua relação com os diversos aspectos da cultura da qual a política é apenas mais um aspecto. Assim o que eu gostaria de chamar de seu agonísmo pragmático limita o valor do conflito e da diferença ao espaço privado da auto-criação. Nesse espaço a produção de diferença seria o valor máximo. Já no espaço público a produção de convergências através da ampliação dos vínculos de solidariedade seria a meta, e o conflito um estágio intermediário em sua direção.

A análise rortyana, esquiva-se a considerar que exista uma alguma área dentro da cultura que não tenha sua origem e razão de ser nos interesses e/ou nas lealdades que constituem os próprios indivíduos concretos. É claro que essa recusa torna o que eu considero a sua própria versão do agonismo pouco viável para os intelectuais que pretendem defender propostas críticas que não são tão claramente decorrentes dos pactos sociais. Do ponto de vista epistemológico, contudo, a postura rortyana é declaradamente retórico-sofística e isso parece congruente com suas teses, penso que o mesmo não se pode dizer da análise de Chantal Mouffe acerca do pensamento de John Rawls. Não obstante, tanto Rorty quanto Mouffe podem ser vistos como defensores de uma sociedade aberta e plural e de uma política atenta as demandas das assim chamadas “minorias”. As diferenças entre os dois são aquilo que poderíamos chamar de divergências “meramente filosóficas”.

Referências

Mouffe, Chantall, O Regresso do Político, trad. Ana Cecília Simões, Ed. Gradiva, Lisboa, 1996.

Oliveira, Nythamar de, Rawls, Ed. Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 2003.

Rorty, Richard, Filosofia com Política Cultural, Trad. João Carlos Pijnappel, Ed. Martins Fontes, 2009.

sábado, 4 de junho de 2011

A irreverência diante do altar: O humor e a filosofia em Max Stirner.


Penso que devem existir filósofos para os quais a afirmação de Alfred Whitehead (1929) de que a história da Filosofia "não passa de uma sucessão de notas de rodapé da obra de Platão” embora soe exagerada não deixa de ser verossímil. Suponho, contudo, que a maioria desses mesmos filósofos não sentem-se muito a vontade com as perspectivas políticas oferecidas por esse mesmo Platão em A República e certamente tentam separar as pretensões universalistas do platonismo das consequências aristocráticas e anti-democráticas manifestas na obra Magna do filósofo grego. Uma separação que o filosófo alemão Johann Kaspar Schmidt, mais conhecido pelo pseudônimo de Max Stirner, talvez considerasse impossível. Em sua obra principal, O Único e sua Propriedade, Stirner desenvolve um discurso, cuja natureza bem poderíamos chamar de anti-platônica, que denuncia os resultados anti-democráticos das pretensões de universalidade características de muitos sistemas filosóficos. A perspectiva oferecida por Stirner parece indicar a existência de uma relação estreita entre a atribuição de um aspecto “universal” ou “absoluto” a certos pensamentos e a instauração de relações mundanas sob a tutela de princípios e hierárquias. Para Stirner, contudo, tais hierarquias seriam apenas estratégias existênciais, modos de lidar com o mundo, adotados pelos “fanáticos do Sagrado”, indivíduos interessados e possessivos mas que tentam incutir o temor a algo “Sagrado, eterno e imutável” com o objetivo de se impor, o que levaria a divisão dos homens em cultos e incultos. Os primeiros prestam honras ao sagrado, ocupam-se de idéias, do pensamento, os segundos tratam de suas necessidades vitais mas como não sabem impor-se aos primeiros terminam por deixar-se imolar no altar dos nobres princípios. Tal veneração, defendida de modo veemente pelos pensadores que fazem parte do que Stirner chama de “pastoral das almas”, denuncia sua natureza pela maneira como lida com o senso de humor. “De fato nada existe de mais sério do que os idiotas quando toca-se no cerne da sua idiotice:tanto zêlo os faz perder totalmente o sentido do humor [basta olhar para os manicômios] (STIRNER, UP, Pg.87). Essa seriedade seria uma das características do que ele chama de veneração pelo Sagrado, uma atitude existencial de consequências importantes para a relação entre aquele que a adota e o mundo que o circunda. Algumas dessas consequências apontadas por Stirner são cruciais para a compreensão da filosofia do modo sugerido por Whitehead . A idéia, por exemplo, de que certas palavras como “verdade”, “liberdade”, prova”, “fato” possuem um valor nelas mesmas é uma dessas consequências. Independente do uso que podemos dar a tais expressões estas possuiriam, para alguns intelectuais, algo que é intrissecamente valioso e substituir uma delas por outra, a palavra verdade pela palavra prazer por exemplo, seria algo semelhante a um sacrilégio. Para Stirner tal atitude reflete a convicção de que tais palavras encarnam algo que nos “escapa”, que é “maior e mais sublime”. “Algo que nos foge” e diante do que só podemos dobrar os joelhos em veneração. Se a seriedade nos agrilhoa ao Sagrado, apenas o humor e tudo que vincula-se a um sadio sentido de auto-afirmação e fruição de si pode conjurá-lo, o que para Stirner não implica abrir mão da cultura teórica da modernidade nem da filosofia, pelo contrário, trata-se de usá-las a nosso “bel prazer”. Se o platonismo tem consequências anti-democráticas e tende a produzir um verticalismo que coloca o intelectual no topo da hierárquia cultural , penso que seria razoável afirmar que um anti-platonismo radical como o de Stirner só pode ter consequências hiper-democráticas e horizontalizantes. Se a cultura platônica faz o homem “deixar de ser criativo para se tornar aprendiz” o fim do estado de minoridade sob a presumida tutela dos intelectuais permitiria a produção de uma cultura ricamente estetizada e pragmatizada na qual os indivíduos relacionam-se uns com os outros sem a mediação de nada que não seja um mero produto deles mesmos. Rindo mais que venerando talvez nos tornassemos mais eficientemente imunizados contra os fundamentalismos que volta e meia batem a nossa porta. O riso, afinal de contas, talvez possa fazer muito pela filosofia.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

O Relativismo cristão de Geanne Vátimo

O mercado de ideias não para de demandar novas produções. Os antigos artefatos vão se tornando obsoletos abrindo espaço para a necessidade de novas versões de velhas promessas. Os filhos são educados por pais cujos valores encontram-se defasados em pelo menos duas décadas em relação ao mundo no qual seus filhos irão crescer. O desconforto diante dessa perspectiva é visível no esforço de pensadores sérios e capazes como Gianne Váttimo em oferecer uma tradução mais sofisticada de palavras que caíram em desuso. Para muitos autores a mudança no valor atribuído a palavras como Deus, Salvação e Verdade levaria a humanidade a um estágio terminal de degradação, mas o professor Vátimo tenta nos dizer que não é assim. "O sujeito pós-moderno está debilitado porque não pode mais apoiar-se num valor absoluto." Esse seria apenas mais um diagnóstico nitzscheano se Váttimo não acrescentasse: "Mas, aqui, debilidade significa redução da violência e das pretensões de valor definitivo." O relativismo, para o filósofo, conduziria a tolerância e a caridade pois para ele "O sujeito debilitado é somente aquele mais tolerante, aberto aos outros." Ora, em primeiro lugar, quero observar que o relativismo não existe, senão na linguagem dos filósofos, tanto quanto a própria metafísica. A maior parte da história da humanidade foi escrita com sangue derramado em disputas entre nações que se auto-denominavam as escolhidas por suas respectivas divindades. A historia do cristianismo caracterizou-se pela tentativa em abarcar todas essas pretensões no interior da sua, usando a lógica e a metafísica por um lado e a inquisição e os exércitos por outro. O sonho de um valor abrangente e universal desde sempre só existiu nas palavras dos pensadores e quando saiu daí, só o fez através da violência, nisso Váttimo tem razão. Mas, para além das disputas de academia e das encíclicas do Papa, é possível afirmar que somos mais relativistas hoje que há 500 anos? Antes de responder a essa pergunta talvez seja necessário dizer primeiro quem são o "nós" de que falamos aqui. Para Váttimo, o nós de que se trata aqui é composto pelos cidadãos europeus cujos avós não podem conter uma expressão indignada diante do capitalismo selvagem e da pouca vergonha hedonista que preenche os programas de televisão. Mais eu quero aplicar a palavra nós em um sentido mais amplo, um sentido que inclua os Aymorés, Tupinambás e Bantos que foram escravizados torturados e mortos pelos "nós" do qual fala Váttimo. Se pensarmos nos termos desse meu "nós" não imagino como podemos continuar aceitando a tese de que somos mais relativistas hoje do que a 500 anos. Se naquela época já existia um relativismo instaurado entre portuguêses e indios e esse relativismo não permitiu nenhuma convivência baseada na caridade, não entendo porque o professor Vátimo espera que hoje em dia façamos diferente. Mesmo o tipo de consciência relativistica caracterísitica de alguns professores de filosofia vêm acompanhada de outros acessórios que são mais importantes que essa consciência. O mêdo de perder o emprego, o desejo de obter a aprovação, a necessidade de reviver momentos mágicos de aclamação do público e etc são exemplos de fatores que servem para comtrapor-se ao tipo de neutralidade que o nilismo de Váttimo preconiza. Dizer que esses fatores seriam menos decisivos para a deliberação ética é dizer que uma razão filosófica é mais forte que uma paixão, algo que considero dificil de levar a sério. Ademais, creio que os departamentos de filosofia espalhados pelo mundo e repletos de consciência relativistica poderiam servir de exemplos empíricos do que quero dizer.
Citações de Vátimo extraidas da entrevista disponível no site abaixo.

http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3701&secao=354

domingo, 12 de dezembro de 2010

RETÓRICA E REALISMO NA RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL DE MARX E O ÚNICO E SUA PROPRIEDADE DE MAX STIRNER

Ocupando a maior parte das páginas de A Ideologia Alemã a crítica de Karl Marx ao Único e sua Propriedade de Max Stirner parece ignorar de forma sistemática o que se poderia chamar de o caráter retórico e existencial dessa obra. Contudo, apesar do descuido destes aspectos, autores como Nicholas Lobkowicz (Lobkowicz, 1969, p. 5) apontam que tal debate teria sido crucial para o amadurecimento do pensamento de Karl Marx, maturidade essa que trouxe a lume obras como O Capital. Visando dar um passo adiante acerca da relação entre as idéias destes dois importantissimos autores o presente artigo pretende opor algumas concepções de Karl Marx no livro I de O Capital à crítica de Max Stirner. Essa crítica, por sua vez, terá na reificação da linguagem e do pensamento seu alvo principal. No decorrer do artigo também desenvolvemos alguns desdobramentos dos pressupostos correspondentistas que perpassam O Capital bem como o uso retórico que Stirner faz da linguagem. Ao final irei discorrer acerca da possível relação entre ambas as posturas e as diferentes concepções de sociedade que delas decorre.
Acesse o artigo completo aqui:

http://www.ufpel.tche.br/isp/searafilosofica/

sábado, 16 de outubro de 2010

"Quando a religião interfere na política o resultadó é fanatismo"

A autoria da frase que dá nome a esse ensaio é de uma pessoa a qual não cabe comentários. Todos nós sabemos quem é José Sarney. Contudo, como diria Aldous Huxley, os homens tolos as vezes dizem coisas muito sábias. Realmente é lamentável que o debate político do segundo turno da campanha presidencial brasileira tenha recaído em questões religiosas. Todavia, já que aconteceu não custa nada tentar tirar algum proveito desse acidente de percurso, que aliás não é acidente algum. O Brasil é um pais cuja cultura é indigesta e inadequada para o estabelecimento das instituições que viabilizam o sucesso do projeto iniciado no Século XVII na Europa. Quanto mais religião, principalmente de matriz católica-fatalista, menos respeito pela individualidade e pelo interesse das minorias. Quando em um pais uma cultura religiosa é alimentada pelo analfabetismo e pela desigualdade social no decorrer dos séculos a probabilidade desse pais se tornar liberal e politizado é muito pequena. É nesse espaço mínimo que nós, os intelectuais liberais de esquerda, nos movimentamos. Na maior parte das vezes é preciso aceitar o debate nos termos mais rasteiros que ele nos é colocado, pois do contrário já entraríamos nele vestindo o capuz dos condenados a forca; se isso acontece existe uma grande probalidade de que apenas os beneficiários do atual sistema de coisas sucederiam-se no poder.
Veja a candidatura de Marina. Que equívoco! Nossos bem intencionados colegas da esquerda mais radical empenharam-se na tentativa de eleger uma candidata que se eleita não governaria, por completa falta estrutura política para isso, e se governasse, teria que fazer concessões que o PT nem sonharia em fazer. Por outro lado o que se conseguiu com tal candidatura? O fortalecimento da candidatura de Serra!!! Seria cômico de não fosse trágico. Agora, depois de conquistar os votos daqueles que com Marina acreditaram que Dilma não é tão de esquerda assim, Serra voa como um vampiro sobre os votos daqueles, que a figura dos devotos de Antonio Conselheiro, vêem no debate político a chance de fazer a sua parte no plano de DEUS.
Marina, a santa prometida que nos fez esquecer qual era mesmo o problema aqui na terra. ABORTO, MENTIROSA...palavras invocadas como estigmas para identificar quem está do lado do Diabo e quem está do lado de Deus. Quando vamos compreender que política, moral e religião são questões que se tocam mais que não podem ser assimiladas umas as outras? Talvez apenas quando nos tornarmos todos ateus.