quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Universidade e pagode: Um caso de amor bandido?

Certo dia quando eu estava a caminho do trabalho, com o olhar passeando nas belas paisagens que se desenhavam contra a janela do ônibus, uma certa mensagem em um outdoor me chamou a atenção. Tratava-se do anúncio de uma das inúmeras festas universitárias que são organizadas em Salvador, principalmente no verão. Todavia, o que me chamou a atenção não foi exatamente o evento em si mesmo (quem não se acostumou a ver grandes shows regados a cerveja sendo oferecidos as dezenas nos outdoors de nossa cidade?) o que provocou essa reflexão que agora divido com vocês foram as bandas que iriam animar o evento. É claro, para um transeunte qualquer também não haveria novidade alguma no nome destas bandas: Psirico, Parangolé e outros de que já não me lembro o nome. Grupos que encontram-se na crista da onda cultural de Salvador e que emergiram das periferias pobres de nossa cidade. Comecei a questionar o seguinte: porque os organizadores de uma festa que reúne universitários (em sua grande maioria estudantes de Direito, Medicina e enfermagem) advindos de segmentos da sociedade bem diversos daqueles dos quais emergiram os estilos musicais em questão optaram por estas bandas? Nos lugares de onde bandas como o Psirico saíram a grande maioria das pessoas não possui formação acadêmica, algumas nunca possuirão, e algumas outras nem mesmo aspiram tal formação. É lógico que não podemos deixar de levar em consideração os fatores históricos e econômicos que determinaram estes fatos. Todavia é também um fato que pode ser constatado por qualquer pessoa que passe algumas semanas em uma sala de aula do subúrbio que a pobreza em nosso pais quase sempre vem associada a uma profunda aversão pela leitura, a sofisticação e ao esforço crítico. “Por causa da pobreza” Diriam alguns, e teriam uma certa razão, mas bastaria uma breve comparação com outros países mais pobres que o Brasil para perceber que a pobreza nem sempre implica a rejeição da leitura e da crítica. O motivo de frases como “quem estuda demais fica maluco.” Ainda fazer sentido para uma grande fatia de nossa população está muito mais nas nossas matrizes culturais, jesuítas e anti-iluministas, que na nossa economia estricto-senso. Frases como essa, diga-se de passagem, fazem sentido também para muitos dos estudantes de nossas classes abastadas, que procuram estudar apenas o necessário para diplomar-se e assegurar o próprio lugar na hierarquia social (daí o sucesso de vendedores de trabalhos acadêmicos). A grande democracia cultural de nossas festas apenas reproduz uma convergência de aspirações. Livre do esforço angustiante dos estudos acadêmicos, da tortura de ter que se submeterem a leituras, debates e seminários, de ter que simular o senso crítico com o fito de diplomarem-se, nossos estudantes procuram para sua diversão e regojizo algo que não lembre em nada a sofisticada cultura acadêmica; Nada prestasse mais a esse papel que a música de nossas periferias, onde a sofisticação é vista como uma marca da pretensão, da boçalidade e, como um caso limite, da loucura. A única diferença, um tanto cruel, é que essa rejeição da cultura acadêmica por aqueles que bem ou mal estão na academia não implica para estes o risco social, a ocupação de postos sub-remunerados de trabalho nem a incapacidade de participar da construção do próprio destino com o mínimo de recursos, como ocorre com os moradores de periferias.

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